sexta-feira, 3 de junho de 2011

1° Fichamento

Fatores genéticos e ambientais na manifestação do transtorno bipolar

Leandro Michelon; Homero Vallada          


“O transtorno bipolar (TB) possui alta prevalência na população mundial e causa perdas significativas na vida dos portadores.”

“Estudos com gêmeos, de ligação e de associação permitiram caracterizar a herdabilidade dessa doença, identificar regiões cromossômicas potencialmente associadas ao TB e avaliar a contribuição de genes candidatos na sua etiologia.”

“Com a compreensão crescente dos mecanismos epigenéticos de controle da expressão gênica, incluindo a interação do genoma com fatores ambientais, e a abordagem dimensional dos transtornos mentais, abrem-se perspectivas promissoras de pesquisas futuras para elucidar os fatores envolvidos na manifestação do transtorno bipolar.”

“Na cidade de São Paulo essa prevalência é de 1% (Andrade et al., 2002). Estudos recentes considerando critérios mais abrangentes, o que permite incluir alterações do humor menos intensas, mas não menos graves, apresentam prevalência de 4% a 8% durante a vida para o continuum bipolar.”

“Entretanto, a distribuição familiar dos casos não segue leis mendelianas de herança genética. A avaliação conjunta dos dados fornecidos pelos estudos epidemiológicos com gêmeos e baseados em grandes famílias com múltiplos afetados sugere um modo complexo de transmissão genética para os transtornos mentais de modo geral. O TB se insere entre as doenças geneticamente complexas, cuja manifestação depende da presença de um conjunto de genes que interagem entre si resultando em uma fisiopatologia também complexa, até o momento pouco definida.”

“Em recente revisão sistemática sobre fatores de risco para manifestação de TB, Tsuchiya et al. (2003) investigaram a possível associação entre TB e fatores demográficos (sexo, etnia), fatores relacionados ao nascimento (complicações na gestação ou no parto, estação do ano no nascimento, local de nascimento – urbano/rural, ordem de nascimento), antecedentes pessoais (QI pré-mórbido, lateralidade, ajustamento pré-mórbido), fatores sociais (padrão socioeconômico, eventos de vida estressantes), antecedentes familiares (disfunção familiar, perda parental) e história médica pregressa (epilepsia, trauma craniencefálico, esclerose múltipla). Associação positiva ocorreu para condição socioeconômica desfavorável, como desemprego ou baixa renda, e estado civil solteiro.”

“Há várias limitações, principalmente em virtude das inúmeras variáveis passíveis de interferência, que dificultam a interpretação dos achados. O fator mais significativamente associado ao desenvolvimento de TB, encontrado em vários estudos, é história familiar positiva, o que remete aos fatores genéticos sugerindo mais uma vez a interação geneambiente, necessária para a expressão de um fenótipo comportamental.”

“Por meio dos estudos de citogenética, foram exploradas possíveis aberrações cromossômicas associadas ao surgimento do TB. Várias regiões foram identificadas como candidatas na suscetibilidade genética do TB. Relatos de anormalidades cromossômicas presentes em famílias de afetados sugerem alguns sítios potencialmente associados ao TB: 1q42.1, 8p21, 9p24, 11q14.3, 11q21-25, 11q23.1, 15q11-13, 15q22-24, 18q23, 18p11.3, 18q21.1, cromossomo 21 e Xq28 (MacIntyre et al., 2003)”

“Estudos iniciais mostraram resultados promissores, mas que não se confirmaram posteriormente. De modo semelhante, vários estudos que se seguiram encontraram um grande número de regiões cromossômicas com associação significativa com TB.”

“Glicogênio sintase 3-beta (GSK3b) é uma enzima que desempenha importante papel no controle do desenvolvimento tecidual e da vida celular. O lítio liga-se diretamente a ela e a inibe, bloqueando processos apoptóticos. Recente estudo encontrou associação positiva entre o alelo T do polimorfismo – 50T/C do gene do GSK3b e início precoce de TB.”

“O fenômeno de antecipação, em que uma doença surge em idade progressivamente mais jovem em gerações sucessivas, pode explicar desvios dos modelos de herança clássicos observados em algumas doenças hereditárias. Repetições em seqüência de trinucleotídeos se correlacionam com a antecipação. Essas seqüências são instáveis, podendo expandir em tamanho entre as gerações e, assim, levar ao agravamento dos sintomas da doença. Embora o fenômeno de antecipação possa ser devido a fatores ambientais, a observação dessa ocorrência em portadores de TB levou à investigação de sua possível associação com a expansão de repetições de trinucleotídeos”

“Outras alterações moleculares foram identificadas para o neuropeptídeo Y, cujos níveis de mRNA estão reduzidos em córtex frontal de bipolares, para o receptor quiinase 3 ligado à proteína G (GRK3), cujos níveis estão diminuídos em um subgrupo de pacientes (Niculesco et al., 2000).”

“Indivíduos afetados por TB se deparam com a importante questão relativa ao risco de sua prole desenvolver a doença. Os estudos populacionais possibilitaram fazer estimativas de risco da ocorrência de TB em parentes de portadores. Sabe-se que, quanto maior a proximidade de parentesco, maior o risco de desenvolver TB (Chang et al., 2003). O risco para filhos de um progenitor afetado é ao redor de 5%, chegando a 15% quando houver também tios afetados.”

“Entretanto, todos os achados são importantes no direcionamento de futuras investigações em genética e fatores ambientais associados ao TB. Diferentes estratégias de estudo são complementares na medida em que fornecem insights e novas hipóteses sobre o surgimento das doenças mentais de modo geral. A investigação de endofenótipos, por exemplo, pode reduzir as dificuldades decorrentes da heterogeneidade da doença a aprofundar o conhecimento dos mecanismos de interação dos múltiplos fatores envolvidos que conduzem ao surgimento de um transtorno mental.”

“Até o momento não foi possível identificar genes ou regiões cromossômicas envolvidos no desenvolvimento de TB, apesar do importante componente genético demonstrado em estudos genético-epidemiológicos. Algumas regiões mostram-se mais significativamente ligadas ao problema, mas ainda se aguarda a confirmação por meio de novos estudos. Genes candidatos têm surgido com o entendimento dos mecanismos de sinalização celular, reforçados pelos estudos recentes de expressão gênica.”

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